Memória e Identidade
Nas sociedades contemporâneas, fortemente marcadas pelos fenómenos crescentes da globalização e da massificação cultural, apercebemo-nos de que os valores culturais permanecem ao longo do tempo, como algo que garante a unidade do tecido social e realça e promove a especificidade cultural de cada comunidade. Neste quadro, de homogeneidade global crescente e de erosão das culturas tradicionais e singulares, as pequenas comunidades sentem cada vez mais a necessidade vital de reabilitarem a sua identidade cultural.
Pela importância socioeconómica que teve na vida das populações e pelo carácter épico-dramático de que se revestiu, a baleação deixou marcas – traços “identitários” - profundas na memória coletiva de muitas localidades açorianas.
Apesar da dimensão regional da atividade baleeira foi, no entanto, na ilha do Pico que o complexo cultural da baleação se exprimiu com maior intensidade. O Pico, como reconhecido e inquestionável referente paradigmático do imaginário baleeiro regional, tem cultivado os valores e as memórias da baleação, consagrados no Museu dos Baleeiros e do Museu da Indústria Baleeira (com projeção nacional e internacional) e revividos na Semana dos Baleeiros.
O bote baleeiro é, incontornavelmente, um dos mais importantes vestígios materiais do património baleeiro e da cultura da baleação. Inspirados na herança norte-americana os açorianos produziram um novo modelo de bote baleeiro, mais comprido e melhor adaptado às condições de navegabilidade dos nossos mares e ao modelo de baleação costeira e artesanal que se praticou nas ilhas dos Açores.
Resultado da capacidade criativa e do génio inventivo dos primeiros grandes construtores navais açorianos, o bote baleeiro açoriano, no entender de muitos especialistas, “a mais perfeita embarcação que alguma vez sulcou os mares”, é um misto de robustez, elegância, eficácia e singularidade.
A atividade da caça à baleia marcou de forma indelével o carácter e o modo de estar de muitos açorianos, abrindo os horizontes das ilhas para o continente norte-americano, fator determinante no nascimento da diáspora açoriana nos E.U.A. e Canadá.
Com o seu termo, ditado por fatores económicos e ambientais, nos finais dos anos 80, do séc. XX, ficou um valioso património de saberes, ao qual está associado um não menos valioso património material, constituído pelas embarcações baleeiras (botes e lanchas de reboque) e a sua palamenta e pelos edifícios e maquinaria que em terra deram corpo às atividades ligadas à baleação.