Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

clima

No arquipélago dos Açores, o clima é essencialmente ditado pela localização geográfica das ilhas no contexto da circulação global atmosférica e oceânica e pela influência da massa aquática da qual emergem. De uma forma muito geral o seu clima pode ser caracterizado pela sua amenidade térmica, pelos elevados índices de humidade do ar, por taxas de insolação pouco elevadas, por chuvas regulares e abundantes e por um regime de ventos vigorosos que rondam o arquipélago acompanhando o evoluir dos padrões de circulação atmosférica à escala da bacia do Atlântico Norte. O clima das ilhas apresenta, no entanto, uma sazonalidade medianamente marcada que se reflecte nos seus diferentes elementos. As quatro estações do ano, típicas dos climas temperados, são reconhecíveis. Os invernos, podendo ser chuvosos, não se manifestam excessivamente rigorosos. A ocorrência de neve, sendo esporádica, só ocorre nas zonas altas. A precipitação acontece durante todo o ano, mesmo nos meses de estio, embora nestes com muito menor expressão. A precipitação de origem frontal é significativamente reforçada pela precipitação de origem orográfica no interior de cada ilha. Os verões são amenos e significativamente mais ensolarados do que o resto do ano. São raros, no entanto, os dias de céu completamente limpo. Os períodos tempestuosos, sendo mais frequentes de Inverno podem, no entanto, ocorrer em fins de Verão e no Outono por efeito de tempestades tropicais esporádicas em evolução próximo do arquipélago. Tempestades violentas, quer de origem tropical quer provocadas por células depressionárias provenientes das latitudes mais setentrionais do Atlântico Norte Ocidental, são responsáveis por numerosos episódios de naufrágios e de tragédias em terra que povoam a história e o imaginário do povo açoriano.

Em termos gerais, muito embora se verifique uma variação das condições climáticas de um extremo ao outro arquipélago e se observe uma variação espacial significativa dentro de cada ilha, o seu clima pode ser classificado de mesotérmico húmido com características oceânicas.

Distribuindo-se diagonalmente, mais em longitude do que em latitude, ao longo de cerca de 650 km e com altitudes bastante variáveis, desde os 402 m da ilha Graciosa aos 2351m da ilha do Pico, as diferentes ilhas do arquipélago apresentam particularidades climáticas distintas resultantes do seu enquadramento no sistema climático e da interacção com este a diferentes escalas. De leste para oeste verifica-se um incremento das características oceânicas no clima das ilhas e, dentro de cada ilha, assiste-se a uma estratificação das condições climáticas determinada pela altimetria. Assimetrias significativas no interior de cada ilha estão relacionadas com a forma e a orientação do relevo, com a estrutura geológica superficial, com a vegetação bem como, em alguns casos, com a influência recíproca de ilhas vizinhas. Os grandes estrato-cones vulcânicos, as caldeiras mais ou menos desmanteladas associadas a estes aparelhos, as lagoas, o alinhamento das formações e das zonas de fractura, o alinhamento dos vales e corredores de ventilação resultantes do encaixe dos diferentes aparelhos, a altitude e orientação das falésias, os aspectos geológicos e da vegetação (aspectos bastante correlacionados, sendo de salientar, neste contexto, a importância das escoadas lávicas pouco evoluídas designadas localmente por mistérios e biscoitos), são importantes factores de diferenciação climática à escala local no interior de cada ilha.

De acordo com a classificação de Köppen, o clima dos Açores está abrangido pela categoria dos climas temperados quentes (grupo C), caracterizados por apresentarem Verão e Inverno e a temperatura média do mês mais frio ser inferior a 18 ºC mas superior a -3 ºC. A distribuição espacial das ilhas conduz, no entanto, a que o seu clima possa ser classificado (de leste para oeste) de transição entre os subgrupos Cs e Cf, respectivamente, transitando «de clima chuvoso temperado com Verão seco a clima chuvoso temperado, húmido em todas as estações». Ainda de acordo com o mesmo sistema de classificação, a amenidade do clima das ilhas pode ser enfatizada pela conjugação da letra b a estes dois códigos passando ambos, Csb e Cfb, a significar que a temperatura do mês mais quente não ultrapassa em média os 22 ºC.

Enquadramento no sistema climático e as grandes determinantes do clima dos Açores

Localizado em plena bacia do Atlântico Norte, a norte da influência predominante dos ventos Alísios e em pleno cinturão subtropical de células de altas pressões, o arquipélago dos Açores situa-se numa zona de transição e de confrontação de massas de ar de proveniência tropical e massas de ar mais frio de origem polar. Suficientemente afastado das costas continentais, as massas de ar de proveniência continental que o atingem à superfície revelam-se descaracterizadas e com forte incremento de propriedades associadas ao seu percurso marítimo. Em altitude, as massas de ar superior, de trajecto mais directo e de proveniência mais remota, continental e mesmo transcontinental, podem, em algumas circunstancias, fazer sentir directamente o seu efeito à superfície, sobretudo nas zonas mais altas das ilhas, situação geralmente traduzida por circunstâncias anormais de secura do ar. Não menos raramente, o ar em circulação na atmosfera livre transporta até ao arquipélago suspensões sólidas, nomeadamente, cinzas vulcânicas ou areias finas do deserto do Saara as quais afectam esporadicamente o clima radiativo e a qualidade do ar.

A dinâmica do clima do arquipélago é determinada pelo evoluir do campo de pressão atmosférica sobre o Atlântico Norte. Às cristas e talvegues barométricos associados ao regime geral de circulação condicionada pela massa do Continente Americano e pela massa aquática atlântica, sobrepõem-se os anticiclones semi-permanentes atlânticos subtropicais dos quais se destaca a configuração recorrente anticiclónica do Atlântico Norte, genericamente designada por anticiclone dos Açores. A norte destes sistemas prevalece uma circulação de oeste e a zona de transição para o ar polar, zona de significativo gradiente barométrico e térmico, designada por Frente Polar. Ao longo desta evoluem os meandros depressionários intercalados por cristas barométricas que, em deslocação para leste, são responsáveis, em larga medida, pelo ritmo sincopado do estado do tempo no arquipélago sobretudo nos meses de Inverno.

Ocupando uma posição central na bacia do Atlântico Norte, as ilhas dos Açores são assediadas por regimes de circulação do ar provenientes de vários quadrantes de acordo com o seu posicionamento relativo à evolução do campo da pressão ao longo do tempo. No Inverno, a tendência de posicionamento do anticiclone dos Açores, mais para sul, acompanhando o deslocamento da célula de Hadley no sentido da Zona Intertropical de Convergência (ZITC), permite uma descida da Frente Polar aproximando-se esta do arquipélago. Nos meses de Verão, pelo contrário, a deslocação do anticiclone mais para norte, condicionado pela migração latitudinal da ZITC, conduz ao afastamento da frente polar e das perturbações que lhe estão associadas para latitudes mais elevadas.

Com carácter de maior raridade, sobretudo nos fins de Verão e no Outono, malgrado a posição setentrional que o arquipélago ocupa, pode este ser afectado pela passagem de ciclones tropicais, ou de tempestades tropicais derivadas destes, umas vezes resultantes de intrusões oportunistas destes sistemas provenientes das baixas latitudes, outras, em circulação de retorno, de volta ao atlântico, após um percurso próximo ou mesmo sobre o continente americano. Destes sistemas, muitas vezes já em vias de dissipação, resultam muitas das piores tempestades a que o arquipélago é sujeito.

A relação do arquipélago com o subsistema climático oceânico é determinante para a configuração do respectivo clima. A sua importância manifesta-se a vários níveis dos processos climáticos, nomeadamente, os energéticos, os dinâmicos e os termodinâmicos. Manifestando os seus efeitos de uma forma integrada, o papel do oceano é determinante quer nos processos de ciclogénese, quer pela fonte de vapor de água à atmosfera que constitui, quer pela sua acção termorreguladora resultante das importantes trocas energéticas à sua superfície, nomeadamente, em calor sensível e calor latente. A importante reserva de energia que representa conduz a que, à latitude dos Açores, durante a maior parte do ano (8 a 9 meses) o oceano ceda energia à atmosfera. Neste contexto, a corrente quente do Golfo, embora com trajecto zonal principal a latitudes mais elevadas - mas cujos meandros derivativos atingem a proximidade ou mesmo a latitude dos Açores - assume importância relevante. A sua influência faz-se sentir por efeito da fonte de energia e vapor de água que constitui, bem como pela barreira que oferece à incursão de águas mais frias de proveniência mais setentrional. Devido a ela o arquipélago revela condições de amenidade singulares, nomeadamente, no que respeita à temperatura, em comparação com outras localidades costeiras à mesma latitude.

Clima normal A descrição quantitativa do clima das diferentes ilhas dos Açores tem sido feita com base nos valores das observações efectuadas na rede de estações meteorológicas sob a tutela do Instituto de Meteorologia (IM) (instituição que assumiu vários nomes ao longo do tempo). A maioria das estações têm vocação sinóptica enquanto que outras estão dedicadas ao apoio aeronáutico. Localizam-se quase todas a baixa altitude, próximas do litoral, pelo que os parâmetros nelas observados só podem ser considerados como representativos das condições climáticas de uma zona limitada do território. O clima em altitude, de extrema importância no contexto insular, pode, no entanto, ser avaliado com base na modelação física dos fenómenos que o condicionam. Este tipo de aproximação tem vindo a ser desenvolvido com recurso à modelação numérica em trabalhos desenvolvidos pela Universidade dos Açores.

Radiação solar e insolação. A quantidade de energia proveniente da radiação solar calculada para uma superfície horizontal no topo da atmosfera à latitude média dos Açores (38º N) é da ordem dos 42 MJ por m2 dia-1 por altura do solstício de Verão, decrescendo para 15 MJ por m2 dia-1 por altura do solstício de Inverno. No entanto, dadas as circunstâncias de atenuação da radiação ao longo do seu trajecto pela atmosfera, nomeadamente, devido à nebulosidade típica destes territórios, estes valores são significativamente diferentes dos observados à superfície das ilhas. Por altura do Verão aqueles valores ficam reduzidos, em média, a 20 MJ por m2 dia-1 enquanto que no Inverno não ultrapassam os 6 MJ por metro quadrado e por dia. Ao se situarem numa zona atlântica de confrontação de massas de ar com características distintas, o arquipélago está grande parte do tempo sujeito a nebulosidade de origem frontal. Por outro lado, pelo facto de se apresentarem como obstáculos à progressão de massas de ar húmido que, por efeito da orografia, é obrigado a contornar o relevo em altitude, as ilhas, sobretudo as mais compactas, estão grande parte do tempo sob a influência de nebulosidade de origem orográfica. Destas circunstâncias resulta que o arquipélago apresente um índice de insolação baixo, da ordem dos 35% em média anual, quando comparado com o total de horas de insolação possíveis. Este facto traduz-se em, aproximadamente, 1600 horas de sol descoberto por ano. A insolação é significativamente superior junto ao litoral quando comparada com a observada em altitude. A insolação é, também, tal como seria de esperar, maior nos meses de Verão, com predominância para os meses de Julho Agosto. Tende, por outro lado, a ser superior nas ilhas mais baixas, nomeadamente, em Santa Maria, Graciosa e Faial. Pese embora o facto de, na generalidade do tempo, as ilhas estarem sob a influência de nebulosidade orográfica, acontece porém que, algumas vezes, o topo das ilhas está acima do manto de nuvens. Esta situação conduz localmente a elevados valores de intensidade da radiação solar.

Pressão atmosférica. A localização geográfica do arquipélago no contexto do campo de pressão à escala da bacia do Atlântico Norte conduz a que a pressão atmosférica nos Açores seja, por norma, superior à média planetária. Os valores da pressão atmosférica quando reduzida ao nível do mar variam pouco de um extremo ao outro do arquipélago apresentando-se ligeiramente mais elevados nas ilhas do grupo Oriental quando comparados com os valores observados nas ilhas mais Ocidentais. Os valores médios mensais mais baixos, próximos dos 1018 hPa, ocorrem em todas as ilhas no período de Inverno com predominância para o mês de Fevereiro. Os valores mais altos da pressão atmosférica ocorrem em Julho e rondam os 1024 hPa. No interior das ilhas a pressão atmosférica decresce condicionada pela variação da altitude e de acordo com a evolução das características das massas de ar que sobre elas circulam. Adoptando a variação da pressão de acordo com o modelo da atmosfera padrão, verifica-se uma diminuição da pressão, aos 1000 metros de altitude de cerca de 110hPa, quando comparada com a observada ao nível do mar. No cimo da montanha do Pico (2351 m de altitude) a diminuição, nas mesmas circunstâncias de comparação, será próxima dos 250 hPa.

A passagem dos diferentes sistemas atmosféricos conduz a variações significativas da pressão; de uma forma brusca à passagem das frentes, decrescendo à proximidade das depressões tropicais ou aumentando aquando da predominância do anticiclone dos Açores.

Temperatura do ar. Junto ao litoral a temperatura média anual em todo o arquipélago ronda os 17,5 ºC. Nas mesmas circunstâncias de localização os valores médios mensais são sempre superiores a 10ºC. A temperatura varia regularmente ao longo do ano, sendo, em média, máxima em Agosto e próxima dos 22,0ºC. As temperaturas médias mensais mais baixas ocorrem em Fevereiro situando-se próximas dos 14,5ºC. Em altitude, a temperatura decresce de forma regular, à razão de 0,9ºC por cada 100 metros (gradiente adiabático seco) até ser atingida a temperatura do ponto de orvalho a uma altitude que se situa, em média, próxima dos 400 metros. A partir daí, dada a cedência de energia à atmosfera pelo processo de condensação, a temperatura decresce de uma forma menos brusca, à razão média de 0,6ºC por cada 100 metros (aproximação ao gradiente adiabático húmido). A amplitude média anual da variação diurna é baixa, próxima dos 5ºC, tendo tendência a ser superior na costa norte das ilhas.

Temperatura da água do mar. A temperatura da água do mar nos Açores varia de forma regular ao longo do ano oscilando, em média, entre os 15ºC e os 23ºC. As mínimas são observadas por altura dos meses de Fevereiro Março e as máximas por altura dos meses de Agosto e Setembro. Com uma temperatura da água do mar em média mais elevada do que a observada nas regiões costeiras do continente europeu à mesma latitude, a região beneficia da proximidade dos meandros descendentes da corrente quente do Golfo. Por essa razão o mar aquece mais cedo nas ilhas do grupo Ocidental do que nas restantes do arquipélago. A temperatura da água do mar é superior à do ar nos meses de Inverno e inferior nos meses de Verão.

Humidade relativa do ar A humidade relativa do ar dos Açores caracteriza-se por ser elevada ao longo de todo o ano apresentando valores médios mensais próximos dos 80%. São raros os dias em que se observam valores abaixo dos 50% (3 a 4 dias por ano junto ao litoral). São mais de 60 os dias do ano em que a humidade relativa atinge, no litoral, valores superiores a 90%. Os valores da humidade relativa variam ao longo do dia acompanhando de forma inversa a evolução diária da temperatura do ar. De manhã a humidade relativa do ar situa-se, em média, próximo dos 80%, decresce ligeiramente até aos 77% por meados da tarde subindo para os 87% durante a noite. Dada a predominante origem tropical das massas de ar que assolam as ilhas por sul, bem como aos fenómenos de condensação e deposição de água nas zonas mais altas, a humidade do ar tende a ser inferior na costa norte quando comparada com a observada nas costas viradas a sul. Quando a circulação atmosférica provém de norte o ar apresenta-se, por norma, significativamente mais seco. Situações sinópticas particulares podem originar oscilações anormais nos valores da humidade relativa. Em altitude a humidade relativa do ar tende a aumentar, acompanhando de forma inversa a evolução negativa da temperatura, enquanto que, ao mesmo tempo, a humidade absoluta diminui. No interior das ilhas, sensivelmente a partir dos 400 metros de altitude, é atingindo com frequência o ponto de saturação. Podem, no entanto, em condições particulares de circulação atmosférica, as zonas de maior altitude das ilhas ficarem sujeitas a ar de extrema secura em circulação na atmosfera livre, acima da camada turbulenta, com taxas de humidade que chegam a baixar a valores próximos dos 10%.

Precipitação Os Açores encontram-se localizados numa zona do Atlântico a que corresponde uma precipitação média anual ao nível do mar que varia entre os 700 e 900 mm. No entanto, o impulso orográfico a que o ar se vê obrigado à proximidade das ilhas conduz a que junto ao litoral a precipitação anual já seja superior a este valor. A precipitação observada ao nível do mar cresce de leste para oeste variando entre os 775 mm observados na ilha de Santa Maria até aos 1700 mm observados na ilha das Flores. Os meses de Setembro a Março concentram 75% do total da precipitação anual. A este período do ano correspondem dois terços dos dias em que se observa precipitação. Sendo por norma abundante a precipitação no arquipélago dos Açores caracteriza-se por alguma irregularidade inter-anual cuja amplitude pode atingir os 1000mm. Assim, a períodos de abundância de água podem seguir-se secas de algum significado que, no passado, antes dos dispositivos de exploração profunda e dos sistemas regularizadores do abastecimento público, conduziam as populações a uma procura dramática daquele elemento, muitas vezes em locais de difícil acesso localizados no interior inexplorado das ilhas ou nos ?pingueiros? situados no mais remoto alcantilado das arribas costeiras.

Velocidade e direcção do vento O vento é uma constante do clima açoriano. Ao longo do ano o vento sopra de forma regular, mais moderado nos meses de Verão, e de forma mais intensa nos meses de Inverno. Situadas em plena zona de confluência de diferentes sistemas de circulação atmosférica, as ilhas são abordadas tanto por ventos que derivam do bordo superior do anticicone dos Açores, como por aqueles gerados a partir dos sistemas depressionários associados à evolução dos meandros da Frente Polar. Em todo o ano predominam os ventos do quadrante oeste. Verifica-se, no entanto, um incremento dessa predominância das ilhas do grupo oriental para as do grupo ocidental. O regime médio dos ventos junto ao litoral é, em larga medida, ?viciado? pela topografia. A sua velocidade média anual é da ordem dos 17 Km h-1. Nos meses de Inverno a velocidade média aproxima-se dos 20 Km h-1, enquanto que, nos meses de Verão, o seu valor decresce para valores próximos dos 10 Km h-1. Soprando em rajadas é raro o ano em que estas não atinjam velocidades próximas dos 100 Km h-1. Verifica-se um aumento médio da velocidade do vento das ilhas do grupo oriental para as do grupo ocidental. Em todas as ilhas a velocidade do vento aumenta com a altitude, assumindo, porém, maior regularidade na sua orientação. De uma forma geral, de Inverno, a evolução sincopada dos sistemas depressionários a norte do arquipélago, conduz a que os ventos rondem as ilhas por norte e de oeste para leste. Durante o Verão, com a subida em latitude dos sistemas de altas pressões as ilhas são assediadas por ventos de sudoeste. Em determinadas circunstâncias o bordo mais meridional do arquipélago pode ser atingido pela circulação dos ventos alísios. Circunstancias anormais devidas à passagem de tempestades tropicais geram ventos fortes cuja direcção decorre do trajecto do sistema depressionário em relação ao posicionamento das diferentes ilhas.

Estudo do clima As primeiras referências a aspectos específicos do clima dos Açores, nomeadamente, ao regime de ventos e às condições de navegação nesta zona do Atlântico, estão relacionadas com os escritos sobre o povoamento do arquipélago e mesmo com as crónicas da viagem de Colombo que, de acordo com os seu biógrafos, terá beneficiado dos conhecimentos sobre ventos e marés de um companheiro de Diogo de Teive , ouvidor do donatário da ilha (Ordem de Cristo), à altura capitaneada por Jácome de *Bruges.

Gaspar Frutuoso, em Saudades da Terra, faz referências específicas às condições de habitabilidade das ilhas dos Açores e a aspectos relacionados com a adaptação de algumas culturas ao seu clima. Chega mesmo a tecer considerações sobre as condições de formação de nuvens em torno da montanha da ilha do Pico, aspecto que, tal como refere José *Agostinho (1944), manifestamente se reveste de interesse meteorológico. Para além destas, são várias as referências que, ao longo do tempo, foram produzidas sobre o clima dos Açores, ora incluídas em diários de viagem, ora como suporte a trabalhos monográficos ou de caracter mais ou menos científico no âmbito de escritos sob temática diversa. O estudo mais aprofundado do clima da região só será abordado de uma forma mais especializada a partir de meados do século XIX.

De acordo com Amorim Ferreira (1955), as primeiras observações meteorológicas nos Açores de que se tem notícia datam de 1817 e estão relacionadas com o trabalho do geólogo americano Webster sobre a ilha de S. Miguel, as quais são incluídas no seu livro A Description of the Island of St. Michael (1821). Também em S. Miguel, Tomás Blunt faz algumas observações (1825) cujos resultados são publicados no artigo The Influence of Climate in the Prevention and Cure of Chronic Diseases (1829) da autoria de Sir James Clark. A crónica de viagem dos irmãos *Bullar aos Açores, A Winter in the Azores and a Summer at the Baths of Furnas (1841), inclui, para além das referências aos registos de Webster e e Blunt, observações efectuadas pelos próprios Bullar. Observações correspondentes a 1842 do capitão de engenheiros Caetano A. Maia são publicadas na Revista Universal Lisbonense (1842-43). Tomás C. Hunt, consul geral britânico nos Açores, publica no Almanack Rural (1821) e na Revista dos Açores (1853), doze anos de observações meteorológicas por si efectuadas na ilha de S. Miguel.

Na Horta foram feitas observações entre 1857 e 1858 sob a orientação de Tomás Bettencourt tendo, após vicissitudes várias, sido retomadas em Janeiro de 1901 num posto montado no terraço do edifício do governo civil. Este posto foi transferido, em 1915, para o entretanto construído ?Observatório do Príncipe Alberto de Mónaco?.

Em Angra, em Outubro de 1864, por iniciativa de Augusto Nogueira Sampaio*, natural da Terceira, médico e ilustre professor do Liceu da cidade , foram iniciadas as primeiras observações de rotina no posto meteorológico localizado na torre da Igreja de S. Francisco (parte integrante do conjunto onde funciona o liceu da cidade). Subordinadas já às normas do Observatório do Infante D. Luís e sob a sua tutela, as observações meteorológicas de Nogueira de Sampaio, bem como todas as suas notas no âmbito das ciências sociais e da natureza, serviram de base à publicação, em 1904, por seu filho, Alfredo Sampaio, da monografia Memória Sobre a Ilha Terceira.

Em 1864 foi dado início em Ponta Delgada à observação meteorológica regular, também enquadrada pelas normas do Observatório do Infante D. Luís, primeiro em instalações anexas ao Liceu da cidade e sob a orientação de Eugénio do *Canto, depois, a partir de 1865, sob a orientação de Carlos Maria Gomes Machado, fundador do museu da cidade. A partir de 1893 o observatório meteorológico de Ponta Delgada passou para a coordenação de Francisco Afonso *Chaves que, em 1900, organizou um projecto para a criação de um Serviço Meteorológico Internacional com base nos Açores. A localização geográfica do arquipélago, quer no contexto da oceanografia quer no da meteorologia, associado ao facto da sua vocação como interposto dos sistemas de comunicação de então, é por várias vezes enfatizada, nomeadamente, com o argumento da sua importância estratégica para a previsão do estado do tempo na Europa. Os Açores,(como) Centro Permanente de Estudos Meteorológicos no Atlântico, tornou-se uma ideia perseguida por Afonso Chaves. O interesse científico do Príncipe Alberto I de Mónaco pelo arquipélago, nomeadamente, o seu desejo em patrocinar a criação do centro de estudos meteorológicos, cujo projecto foi apresentado em 1900 ao Congresso Meteorológico Internacional, contribuiu, decisivamente, para a intervenção do Rei de Portugal, D. Carlos, que decidiu, numa atitude de afirmação nacional, prescindir da colaboração estrangeira proposta e encarregou Afonso Chaves de organizar o Serviço Meteorológico dos Açores, tendo este sido aprovado no Parlamento por Carta de Lei de 12 de Junho de 1901; «Suas Magestades El-Rei e a Rainha, desejando manifestar por forma bem patente, o grande interesse que lhes aprazia tomar pela nova instituição, vieram aos Açores colocar a primeira pedra do observatório Meteorológico da Horta», «?a memorável visita régia aos Açores, em 1901, teve, perante o exterior, o intuito de alta significação diplomática, de manifestar a repugnância da Nação em aceitar uma intervenção estranha nos Açores, a coberto dum fim científico, para fazer face ao qual estamos aliás preparados com os recursos próprios?A intriga diplomática à volta do assunto foi bastante activa e só a intervenção oportuna e firme de D. Carlos a desfez dum modo decisivo» (Agostinho, 1944).

A partir de 1911, dado o interesse crescente da meteorologia e da climatologia aplicada a diferentes fins, foram desenvolvidas algumas iniciativas no sentido da criação de postos de observação meteorológica tuteladas por diferentes ministérios muitas vezes em sobreposição territorial. Em 1946, por Decreto-Lei nº 35 836 de 29 de Agosto, foi extinto o Serviço Meteorológico dos Açores e integrado no Serviço Meteorológico Nacional instituído pelo mesmo diploma. Esta instituição assumia funções integradoras e as responsabilidades no que dizia respeito a obrigações nacionais e internacionais no domínio da meteorologia e da geofísica. É desta instituição, que vai assumindo ao longo do tempo vários nomes, e funcionando sob várias tutelas ministeriais, bem como do acervo do Observatório do Infante D. Luís, que deriva a maior parte da informação histórica da meteorologia de superfície do arquipélago. É também a estas duas instituições que, de alguma forma, estão ligados os principais nomes que nos dois primeiros terços do século XX, estudaram o clima dos Açores. De entre eles destacam-se, para além dos nomes já citados, os de José Agostinho, autor de vasta bibliografia sobre as ciências naturais dos arquipélagos atlânticos, o de Amorim Ferreira, responsável pela elaboração de importantes monografias sobre o clima dos Açores e das personalidades ligadas ao seu estudo, o do engenheiro agrónomo Manuel Leonardo *Bettencourt, autor de importante trabalho de caracterização climática com base no espólio da rede meteorológica oficial, e o de Denise de Brum Ferreira, responsável pelo principal estudo sobre as determinantes dinâmicas do clima da região.

Também nos Açores, o desenvolvimento das comunicações observado ao longo da Segunda Grande Guerra, bem como as necessidades impostas pela estratégia militar, nomeadamente, as que decorreram do crescimento da aviação militar contribuíram para um forte incremento das técnicas de observação e previsão meteorológica. O tráfego aéreo controlado pelo aeroporto de Santa Maria e pela base das Lages passou, a partir dos anos cinquenta, a dispor do apoio de observações aerológicas. Recorreu-se, para o efeito, à informação proveniente de balões meteorológicos lançados a partir da ilha Terceira (integrando as Lages, conjuntamente com o Funchal e Lisboa, a actual rede de observação aerológica nacional). Mais recentemente, por finais do século XX, a capacidade de acompanhamento meteorológico das ilhas foi reforçada com o apoio do radar meteorológico da Serra de Santa Bárbara na ilha Terceira. Em simultâneo, e durante toda a segunda metade do século vinte, o desenvolvimento das tecnologias da comunicação, da computação e da detecção remota por satélite conduziu a um forte desenvolvimento de técnicas que permitem o acompanhamento do evoluir do estado do tempo e da acumulação e tratamento da informação de suporte aos estudos climatológicos. O recurso aos modelos numéricos, nomeadamente, aos Modelos de Circulação Global (GCMs), bem como às imagens de satélite e a toda informação disponível na internet tem permitido um refinamento da capacidade de previsão meteorológica e de interpretação e caracterização do clima. No entanto, devido à complexidade do sistema climático, pese embora todo o desenvolvimento científico observado no sector, continua a ser absolutamente necessário dispor de observações da realidade meteorológica e climática que permitam o desenvolvimento e actualização dos modelos conceptuais, bem como a alimentação e a calibração dos modelos matemáticos operacionais. Neste contexto, as ilhas dos Açores revelam-se como plataformas ideais para o preenchimento do vácuo observacional que constitui a vasta bacia do Atlântico Norte, quando comparado com a densidade das redes meteorológicas situadas nos continentes que o enquadram. Por outro lado, a perspectiva das mudanças globais climáticas obriga a uma atenção muito particular aos sub-sistemas climáticos oceânicos. Torna-se, por conseguinte, surpreendentemente actual e pertinente a importância meteorológica dos Açores, tal como a preconizaram Afonso Chaves e José Agostinho, justificando-se, plenamente, a sua visão do arquipélago como Centro Permanente de Estudos Meteorológicos no Atlântico. Eduardo Brito de Azevedo (2002)

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