Os Açores ficaram ligados à rede mundial de cabos submarinos a partir de 1893, ano em que foi lançado o primeiro cabo para o arquipélago, unindo a estação de Carcavelos, nos arredores de Lisboa, com a ilha de S. Miguel e desta para a cidade da Horta, na ilha do Faial, num total de 1 140 milhas.
As duas primeiras estações instaladas, em S. Miguel e no Faial, pertenciam à companhia inglesa The Telegraph Construction and Maintenance Cº, com a qual o governo português celebrara um contrato datado de 15 de Junho de 1893 para o lançamento e manutenção dos cabos e à qual eram concedidos direitos exclusivos de exploração pelo prazo de 25 anos. A ligação às ilhas Flores e Corvo ficava, segundo o referido contrato, a constituir uma futura obrigação e compromisso de execução logo que surgissem lançamentos de cabos para a América do Norte. Esta disposição contratual seria mais tarde alterada e as ligações com aquelas duas ilhas do grupo ocidental efectuar-se-iam, não por cabo mas sim por telegrafia sem fios (T.S.F.).
Os telegramas via cabo e destinados às diferentes localidades açorianas e vice-versa, eram recebidos e distribuídos pelas estações dos Correios. Estava prevista a circulação gratuita, via cabo de telegramas contendo informação meteorológica, provenientes e destinados aos respectivos observatórios, desde que não excedessem um determinado número de palavras ou vocábulos. O contrato de 1893 abrangia também a ligação por cabo entre as ilhas do grupo central, Faial, Pico, S. Jorge, Graciosa e Terceira.
A partir de 1895, esta empresa cedeu os seus direitos a uma nova companhia: a The Europe and Azores Telegraph Cº.
Embora esta primeira fase do empreendimento significasse um importante passo na quebra do isolamento das ilhas e uma possibilidade de comunicarem com o mundo através da rede dominada pela companhia inglesa (rede vermelha), só a partir de 1899, mediante novo contrato que permitia a abertura dos Açores à instalação de cabos americanos, alemães e italianos, foi a Horta elevada à categoria de estação telegráfica internacional, mantendo-se, ao longo dos anos, Ponta Delgada, na situação de estação secundária. O novo edifício, terminal de comunicações internacionais, conhecido por Trinity House, construído no início do século XX, albergava estações de diferentes companhias: Deutsche Atlantisch Telegraphen Gesellschaft, alemã, Commercial Cable Company, americana e Europe and Azores, inglesa. Anos mais tarde, com a construção da joint station, concluída em 1928, passou a incluir também a Western Union Telegraph Coy.
Ao longo dos anos foram surgindo amarrações de cabos, na ilha do Faial, que correspondiam a outras tantas ligações à América, Europa e África, num total de 15 cabos, atingido no fim da década de 1920. A distribuição de ligações aos diferentes terminais processava-se, nessa altura de acordo com o seguinte esquema:
a) Companhia inglesa: - 1 cabo Horta-Carcavelos (com ligação intermédia em Ponta Delgada); 2 cabos Horta-Inglaterra; 1 cabo Horta-Canadá; 1 cabo Horta-S.Vicente, Cabo Verde; 1 cabo Horta- Manhattan Beach (E.U.A.); e 1 cabo Horta-Deolon (França)
b) Commercial Cable Company - 2 cabos Horta-Canada e 2 cabos Horta-lrlanda.
c) D.A.T. (companhia alemã) -1 cabo Horta-Alemanha
d) Western Union Telegraph Coy - 2 cabos Horta.- E.U.A. e 1 cabo Horta-Málaga
Este esquema sofreu modificações ao longo dos anos, resultantes essencialmente das consequências que os cortes dos cabos alemães, levados a efeitos pelas forças aliadas, no inicio das duas guerras mundiais vieram a ter na alteração do diagrama.
O Tratado de Versalhes, após a guerra de 1914/18, retirou aos alemães a posse dos cabos que os mesmos mantinham ligados na estação da Horta, cortados logo após o início das hostilidades e entregou a exploração dos mesmos, depois dos respectivos desvios, à companhia inglesa e a uma empresa de cabos francesa que, por sua vez cedeu, mediante contrato, a operacionalidade dos que lhe tinham sido atribuídos pelo referido tratado, à companhia inglesa.
As companhias estrangeiras instaladas nos Açores, nomeadamente as duas americanas e a alemã que mantiveram estações na Horta e a companhia inglesa igualmente responsável pela instalação de Ponta Delgada, admitiram, ao seu serviço, ao longo dos anos, muitos empregados portugueses (aliás uma obrigação contratual) e chegaram a manter, no seu conjunto, várias dezenas de elementos locais, integrando os respectivos staffs e trabalhando em conjunto com os estrangeiros no desempenho da diversidade de tarefas, quer como operadores quer como técnicos.
O cabo submarino, na sua designação genérica, constituiu durante algumas décadas, fonte de emprego para muitos jovens açorianos que encontravam ali um modo de vida, mais ou menos estável com ofertas salariais de níveis bastante vantajosos. As variações no movimento de tráfego circulado pelas estações açorianas processaram-se sempre em consequência das guerras e crises económicas mundiais, nomeadamente o famoso crash da bolsa de Nova York, ocorrido em Outubro de 1929. Estas e outras causas determinaram a existência, em diferentes épocas de um maior número de empregados admitidos mas, também despedimentos, estes últimos com maior incidência logo após o referido crash bolsista.
A cidade da Horta, principal ponto de amarração de cabos, nos Açores, mercê da influência duma colónia de estrangeiros, abrangendo um número significativo de famílias, vivendo paredes meias com a população local, assumiu o seu destino de centro cosmopolita onde se trocavam experiências e se iniciavam novas vivências nos campos desportivo cultural e recreativo.
A partir da década de 50 inicia-se a nível mundial um boom de espectaculares progressos no domínio das telecomunicações que conduziu definitiva e inexoravelmente à obsolescência dos cabos submarinos de antiga concepção. A área mais atingida, de início, foi a das estações intermédias ou relay stations. Se por um lado os novos condutores submersos, designados por "coaxiais", eram dotados duma imensa capacidade de transmissão, incluindo canais telefónicos, por outro, permitiam também a incorporação na sua estrutura de amplificadores de sinais que, à partida, possibilitavam o seu lançamento entre pontos colocados a milhares de milhas de distância, o que iria dispensar a função das referidas estações intermédias.
O fim do tempo dos cabos nos Açores, nos finais da década de 60, com o encerramento das últimas estações, veio pôr termo a uma época marcada por algum progresso e forte vivência social, nomeadamente na cidade da Horta, onde deixou vestígios ainda hoje bem detectáveis nas numerosas construções que foram sede dos serviços de exploração mas que também se destinavam a habitação das muitas famílias que ali viveram deixando a marca indelével da sua passagem. Carlos Silveira (Mar.2001)