História
ver também Horta (concelho)
Heráldica
O reconhecimento da meritória intervenção da ilha do Faial e de muitos dos seus cidadãos no desenrolar do processo político que conduziria à vitória definitiva da causa liberal, D. Luís I atribuiu à cidade da Horta brasão de armas. De acordo com o decreto de 3 de Maio de 1865, a par da concessão de brasão de armas, à Horta foi outorgada o direito de ostentar o título de Muito Leal.
O brasão é constituído por um escudo esquartelado no qual, no primeiro quartel em campo de prata apresenta as quinas, no segundo em campo azul o busto de D. Pedro IV, no terceiro em campo azul um livro aberto com a inscrição da data de 29 de Abril de 1826, alusiva à aprovação da Carta Constitucional e, por fim, no último quartel, em campo de púrpura, um castelo de prata encimado por um açor. O brasão é orlado pela inscrição a ouro «D. Luiz I à mui leal cidade da Horta». No contrachefe mostra uma coroa e ceptro em ouro em referência à abdicação de D. Pedro. Sobre a orla uma coroa ducal e por timbre um braço de prata empunhando espada. Ricardo Manuel Madruga da Costa
Urbanismo
De um ponto de vista geral, a imagem da cidade da Horta que nos surge, desde a panorâmica da Espalamaca ou do Monte da Guia, corresponde claramente ao modelo da cidade insular de raiz portuguesa, litorânea e de traçado medievo-renascentista, desenvolvida e firmada nas edificações robustas dos séculos XV ao XVIII ? com a graciosidade que as arquitecturas dos séculos seguintes, do romantismo polícromo de Oitocentos ao modernismo inovador século XX, lhe souberam acrescentar.
Vila até 1833, povoação de fachada marítima, atlântica, desenvolvida ao longo de uma abrigada enseada, entre a praia e o incompleto cone vulcânico (numa morfologia que evoca Angra na Terceira ou as Velas jorgenses) (Fernandes, 1996), virada aos quadrantes de Nascente e de Sul (ou mais exactamente, ao quadrante de Sudeste), a Horta estrutura-se aparentemente, e quase só, como a «povoação da rua única», paralela ao oceano e cortada por várias travessas (a rua longa que vai da praça da República ao Colégio, deste a São Francisco, e daqui ao Forte de Santa Cruz e às Angústias). Esta é uma cidade visitada frequentemente por viajantes de ocasião, ao longo dos séculos XIX e XX ? que, por exemplo, Vitorino Nemésio (O Corsário das Ilhas), Raul Brandão (As Ilhas Desconhecidas) ou mesmo Júlio Verne (A Agência Thompson e Comp.) descrevem ou ficcionam:
«Gosto da Horta como de nêsperas! Tinha saudades do que fui, já nem sei bem como, aqui. Todo o imaginado é mais ou menos frustrado quando o realizamos; mas na Horta não, que é excedido. Ao comprido da rua do Mar desenvolvem-se as casas; sobre a célebre rua única da cidade as travessas que descem da encosta trazem também a sua modesta contribuição de fogos e de trânsito.»
Vitorino Nemésio, O Corsário das Ilhas, 1956 (2.a edição, Livraria Bertrand, 1986)
«Já vejo a Horta ao fundo da baía limitada por dois morros, o Monte Queimado numa extremidade e na outra o Monte da Espelamaca. É uma cidade de uma só rua, como eles dizem, a branco e cinzento. Alguns conventos, algumas igrejas pesadas [...] Calçadinhas desertas e ruas solitárias, atravessadas de vez em quando por um meteoro louro: são as raparigas americanas do cabo, a galope de cavalo, com os cabelos ao vento.»
Raul Brandão, As Ilhas Desconhecidas, 1926 (Editorial Comunicação, 1988)
«Vista de perto, como é bastante menos cativante a Cidade da Horta! Compõe-se quase exclusivamente de uma só rua bifurcada na extremidade. Rígida, estreita, irregular, mal pavimentada, essa rua não será o que pode chamar-se um belo passeio. Já ardente àquela hora do dia, o sol metia-se por ela adentro queimando nucas e costas [...]»
Júlio Verne, A Agência Thompson e Comp.
(In «De Fora para Dentro», antologia, org. por Fernando Ribeiro de Mello, Edições Afrodite, Lisboa, 1973)
Mas, num olhar mais detalhadamente analista, do ponto de vista da sua história e génese urbana, a Horta apresenta matizes e diferenças em relação a esta primeira imagem. Efectivamente, esta cidade é, no seu tecido urbano histórico, muito mais do que uma rua principal ? e não seria, inicialmente, sequer, «essa» a rua principal. O pólo urbano inicial, a sul da Conceição (Barreira, 1995), por certo se desenrolou ao redor da matriz, ou melhor, entre esta e a praça cívica, a nascente da igreja e a caminho da praia, de um modo bipolar (dentro da tradição espacial e funcional da cidade portuguesa medievo-renascentista) ? como a perspectiva do capitão Edward Wright (1589) (Barreira, 1995) e a «Planta das Fortificações...» de 1804 (Planta das Fortificações, e Bahias..., s.d., cerca de 2001) balizam cronologicamente e atestam graficamente.
A acreditar nestes registos cartográficos, e confirmando igualmente através do atento calcorrear actual por ruas e caminhos, entre os vestígios de tantas vias e edifícios destruídos em sismos subsequentes, a Horta dos primeiros séculos seria constituída por uma malha proto-urbana (que com o seu desenvolvimento assumiu a dimensão urbana), de cinco ruas no sentido nascente-poente, e de outras cinco no sentido Norte-Sul. Seria pois esta a sequência da sua estrutura (Este-Oeste), com os seus arruamentos fundadores:
- a rua da Vista Alegre/Ladeira da Paiva/travessa Almeida Garrett (ou as antigas Canada das Galinhas/Ladeira da Matriz) ? com a Matriz e a Igreja e Convento de São João;
- a rua Advogado Graça/travessa do Poiso Novo (ou as antigas Ladeira de Santo António/Travessa da Cadeia/Travessa da Glória) ? com a Casa de Câmara e o Convento da Glória;
- a rua de São Paulo;
- a rua de São Pedro e travessa da Misericórdia;
- e a rua Dr. Azevedo e a calçada Major Ávila, já na entrada do largo do Colégio.
Quanto aos arruamentos no sentido Norte-Sul, seriam os seguintes:
- a rua de São João (que acompanhava a fachada e a cerca do convento homónimo);
- a estreita e curta rua Tenente Aragão (antigas rua do Adro/da Matriz/dos Enjeitados), que ainda hoje desemboca junto ao Império e à Sociedade «Amor da Pátria» ? e onde o enfiamento da actual torre do Relógio (sobrevivente da torre da Matriz) é visível, sendo também visível, do lado oposto, o enfiamento da fachada do Colégio e, mais longe, da edificação dos Franciscanos, comprovando o natural desenvolvimento urbano processado ao longo destas vias;
- as ruas da Conceição/alameda Barão de Roches/rua D. Pedro IV/rua Ernesto Rebelo (antigas rua da Praça/praça do Gado/rua da Glória), com o Pelourinho, a Casa de Câmara e Cadeia, e o Convento da Glória ? constituindo esta praça e via, o primeiro lugar central da urbe, local das melhores casas solarengas e da igreja da Misericórdia;
- as Ruas Maestro Simaria (convergente com a rua Almeida Garrett, no Largo do Bispo D. Alexandre), e enfiando na rua Serpa Pinto, que desemboca no antigo Largo do Colégio Jesuíta;
- e a rua Conselheiro Miguel da Silveira, antiga rua confinando com a muralha, e hoje articulada de modo aberto com a avenida marginal, de Diogo de Teive.
Esta primeva «rede» de vias, desenvolvida ao longo da Ribeira da Conceição, recorda um pouco a génese urbana de Angra do Heroísmo, que em outro estudo procurámos desenvolver (Fernandes, 1989). Também aqui a fixação inicial pareceu implantar-se naturalmente, na colina ao correr da ribeira (onde os moinhos poderiam produzir pão?), em ruas ou ladeiras paralelas entre si e perpendiculares ao mar, mais facilmente defensáveis ou pelo menos, psicologicamente, mais apartadas da violência das ondas e do ignoto do oceano; numa fase seguinte, também em Angra parece ter o povoado nascente «descido», gradual e cautelosamente, até à «baixa» junto à praia, onde finalmente, na «praça», lugar cívico, surgiram a câmara, o poço de água e a misericórdia.
Terá sido assim que, na Horta, as ruas sucessivas foram sendo abertas, em sequentes planos paralelos e cruzados entre si. À sua volta, os poucos conventos definiam uma área de influência urbanizadora, marcando ao mesmo tempo a passagem para os espaços das hortas e da ruralidade (com os conventos do Monte do Carmo e dos Capuchos já na periferia noroeste).
Os limites lógicos desta malha de dez ruas seriam: a sudeste, a praia e a sua muralha; a noroeste, a rua de São João; a nordeste, a passagem em ponte sobre a ribeira, para a Conceição; e finalmente, a sudoeste, o amplo largo triangular do Colégio (depois do Duque de Ávila e Bolama, com a Câmara/Museu), que, qual rossio de passagem ao arrabalde, com o crescimento posterior do núcleo nesta direcção, se tornaria por sua vez num novo lugar central, substituindo a antiga «praça» a nascente (hoje absorvida pela Praça da República).
Só mais tarde, a rua longa e bordejando o mar, em direcção a São Francisco e ao forte de Santa Cruz, se foi erguendo, edificando e consolidando ? qual «rua Nova» ? entre Seiscentos e Setecentos (veja-se que na gravura de 1589 este arruamento, já marcado, ainda tem uma feição semi-rural, com quintais de um dos seus lados; já na planta de 1804, está plenamente urbanizado, bem como os quarteirões envolventes a noroeste).
Embora toda esta possível leitura de um crescimento urbano esteja dificultada pelas sucessivas destruições que sismos e catástrofes naturais e humanas provocaram (como na Praia terceirense ou na Vila Franca do Campo micaelense), parece esta ser uma hipótese de leitura fundamentada, quer no processo evolutivo dos outros modelos insulares, quer pela verificação geo-morfológica directa.
Nas décadas mais recentes, a Horta tem vindo, à semelhança da maioria das urbes portuguesas, a crescer para os seus arrabaldes rurais, quer em termos habitacionais, quer de equipamentos e serviços. Este crescimento não se materializa num espaço tão denso e tão ordenado como o da anterior cidade histórica, colocando novos problemas urbanos, como os da circulação e tratamento dos espaços públicos.
De qualquer modo, a cidade soube preservar, ao longo do século XX, um dos seus valores essenciais, o da relação com a baía e o mar, quer pela edificação da avenida marginal (entre 1956 e 1965, que lentamente vai construindo e consolidando uma fachada arquitectónica), quer pelo lançamento de infra-estruturas lúdicas como as marinas para barcos de recreio (por Jorge Kol de Carvalho, 1984) (Carvalho, no prelo), que têm ajudado a reforçar a sua imagem e funcionalidade principal: a de atraente cidade marítima e pequeno porto de escala e de turismo atlântico.
Finalize-se esta abordagem à Horta com um aspecto estruturante da imagem e vida da cidade: a relação, visual, climática, paisagística, e muito açoriana aliás, com a «ilha em frente» ? neste caso consubstanciada na presença obsessiva e monumental da fronteira montanha do Pico:
«A outra coisa que exerce aqui uma verdadeira fascinação é o Pico ? tão longe que a luz o trespassa, tão perto que quer entrar por todas as portas dentro. Na verdade, parece um efeito mágico de luz, um fantasma posto aí de propósito para nos iludir e mais nada. Toma todas as cores: agora está violeta, logo está rubro. [...]. É majestoso e magnético: Está ali presente como um vagalhão que vai desabar sobre o Faial [...]. Se eu vivesse aqui, queria uma casa e uma cama onde só visse o Pico. Ele enchia-me a vida.»
Raul Brandão, As Ilhas Desconhecidas, 1926 (edição Editorial Comunicação, 1988).
José Manuel Fernandes
Arquitectura Como em qualquer cidade de expressão portuguesa, a Horta vale sobretudo pelo seu conjunto espacial urbano, que agrega todo um conjunto arquitectónico de simples casas e prédios, pontuados aqui e acolá por também modestos monumentos.
Recorramos às referências de alguma literatura de viagens para evocar uma ambiência (no caso, inserida na época oitocentista), que advém desta presença arquitectónica, feita de habitações e espaços domésticos essencialmente vernáculos e austeros, e da sua mais discreta e quotidiana utilização:
«[...] velhas e simpáticas casas de província com varandas de madeira e reixas: às vezes na varanda um postiguinho para a mulher falar ao namoro acocorada no chão ? cheguei-me ao ralo ? dizem as meninas. [...]. O que dá um grande carácter a esta terra é o capote. A gente segue pelas ruas desertas, e, de quando em quando, irrompe duma porta um fantasma negro e disforme, de grande capuz pela cabeça. São quase sempre as velhas que o usam, mas as raparigas, metidas na concha deste vestuário, que pouco varia de ilha para ilha, chegam a comunicar encanto ao capote monstruoso. É um ser delicado e loiro e o contraste realça a figurinha [...]»
Raul Brandão, As Ilhas Desconhecidas, 1926 (Editorial Comunicação, 1988)
A rudeza das construções domésticas ? exemplarmente afirmada em muitas das mais antigas fachadas que ainda subsistem actualmente nas ruas principais da área histórica, provavelmente oriundas dos séculos XVII e XVIII (sobretudo na chamada «rua única» da povoação) ? assenta nos materiais basálticos, na alvenaria caiada, no desenho irregular dado pelo contraste entre o negro da pedra vulcânica e o branco luminoso das paredes caiadas. Disso se apercebeu, embora com alguma incompreensão de estrangeiro cosmopolita, Júlio Verne:
«As casas que ladeiam a rua da Horta não têm interesse suficiente para que, através da alma, saibamos desprezar os incómodos do corpo. Grosseiramente construídas em paredes de lava de grande espessura, a fim de resistir melhor aos tremores de terra, inscrever-se-iam na banalidade mais acabada [...] Nessas casas, o rés-do-chão é irregularmente ocupado por lojas, cavalariças ou estábulos [...]. Todas as casas se projectam para a frente numa varanda larga, uma verandha, fechada a gradeamento de caniço. Os burgueses indígenas fazem longas permanências por detrás do abrigo protector e daí observam a rua, espiam os vizinhos e os transeuntes [...]»
Júlio Verne, A Agência Thompson e Comp.
(in De Fora para Dentro, antologia, org. por Fernando Ribeiro de Mello, Edições Afrodite, 1973)
Mas fiquemos antes, e encetando uma pequena viagem através da arquitectura da cidade, pela referência à resultante positiva, num tempo longo, destes desastres e destas mudanças, que se evidencia na diversidade, originalidade e riqueza plástica das obras edificadas existentes na Horta. O levantamento Horta / Faial Inventário do Património Móvel dos Açores (2003), bem como o livro de César Barreira (1995) organizam correctamente a informação essencial sobre esta arquitectura, pelo que os seguiremos em termos gerais (veja-se também o folheto sobre o património da Junta de Freguesia da Matriz) (Freguesia da Matriz..., s.d.).
Refiram-se os três ou quatro edifícios de habitação no eixo das ruas Serpa Pinto/Walter Bensaúde/Conselheiro Medeiros/Vasco da Gama (a referida e mítica «rua única» da cidade), de origem mais antiga (provavelmente dos séculos XVII e XVIII), de sólida expressão, com dois pisos cintados com faixas de espessa pedra basáltica, contrastando com os panos de fachada caiada a branco (e, pontualmente, exibindo as reixas de madeira nos avarandados): são exemplo o n.o 11 da rua Walter Bensaúde (com aventais decorativos em basalto), os n.os 7, 9 e 11 da rua Conselheiro Medeiros (de varanda corrida ao longo da fachada), o n.o 26 da rua Serpa Pinto (tornejando para a Travessa da Misericórdia), e o n.o 24 da rua Vasco da Gama. Igualmente com dois pisos, e torrinha central, é o edifício da rua D. Pedro IV, n.o 29.
Na rua Comendador Ernesto Rebelo, também podem citar-se solares da época do século XVIII: o n.o 10 («Solar dos Andrade») e o n.o 19 (esquina com a Travessa da Misericórdia); e, dos finais de Setecentos, o solar dos Lacerdas (rua da Conceição n.o 24). De Setecentos mas possivelmente redesenhado na fachada, é o «Solar dos Oliveiras», onde viveu José Estêvão de Magalhães em 1831-32 (rua Serpa Pinto n.o 24).
Do século XIX ? tempo de crescimento e modernização para a Horta ? há diversos edifícios testemunho, com uma escala mais grandiosa e um desenho mais elegante do que os dos seus antecessores: são exemplo os edifícios de vocação comercial (mas com tipologia idêntica à residencial) da «Bensaúde & C.ª» [ver Bensaúde, S.A.], e da «Fayal Coal» ambos na rua Vasco da Gama, e o imóvel misto (habitação e comércio) da Praça do Infante n.o 14 (com fachada azulejada).
Mencionemos, ainda neste quadro, os grandes solares burgueses, como o Solar de Santana (rua Visconde de Santana, com capela anexa), ou a «Casa Grande dos Bensaúde», de meados de Oitocentos (de três pisos imponentes, na rua Walter Bensaúde n.o 14), os edifícios de dimensão média (rua Serpa Pinto n.o 29), e os prédios mais modestos mas bem demonstrativos desta época (rua Serpa Pinto n.o 16; rua Walter Bensaúde n.o 8, rua Serpa Pinto n.o 30, com «torrinha» superior de vãos ogivais e inspiração neo-gótica, balaustrada e guardas de varandas em ferro fundido) ? e ainda as residências que ensaiam uma tipologia de villa, mais recatada em relação ao plano do arruamento, de que é exemplo a «Bagatelle», casa dos Dabney, de cerca de 1812 ou 1823 (rua de São Paulo).
Da transição dos séculos XIX-XX fica-nos ainda um significativo conjunto de equipamentos, que deu carácter mais urbano à vila (entretanto elevada a cidade), nomeadamente: o Teatro Faialense (primeiro edifício em 1856, reconstruído em 1916 pelo engenheiro Francisco Assis Coelho *Borges, recuperado como Centro Cultural pelo arquitecto José Lamas em 2002); o antigo Hospital da Misericórdia (datado de 1901, de corpos simétricos e disposição pavilhonar, ao modo característico de Oitocentos), fronteiro ao romântico jardim Florêncio Terra (com estatuária datada de 1883); e vários espaços públicos tratados com mobiliário diverso, desde as espécies arbóreas raras, os lagos e os coretos, em jardins e praças (com destaque para o Jardim da República, de clara expressão Romântica). Refiram-se ainda as pavimentações extensivas de ruas com o padrão tradicional português, com pedra em negro e branco (iniciadas em 1825 pelo governador Roxelebem, e continuadas cerca dos anos 1940 com desenhos pelo arquitecto Read Teixeira).
No sector mais a sul da cidade, há que referir o conjunto de vocação portuária do actual edifício das Obras Públicas (rua Filipe de Carvalho), com os Armazéns e garagem da locomotiva, orientados no eixo da rua Comendador Fernando da Costa (esta perpendicular à linha de mar, e que incluiu uma central termoeléctrica até 1967), e o paredão da doca (iniciada em 1876, que teve via férrea de serviço e máquina a vapor). Na rua Vasco da Gama, registe-se o edifício da Alfândega, de corpo superior em frontão.
Dos vários edifícios das «colónias europeias», para instalação dos cabos submarinos (a alemã, a inglesa e a americana), edificadas na viragem dos séculos XIX-XX, na área das ruas Cônsul Dabney e Marcelino Lima, podemos destacar: a «Colónia Alemã», conjunto de cinco edifícios formando pequeno bairro ajardinado e arborizado (com marquises envidraçadas e vitrais); o «Trinity House», das antigas Companhias de Cabos Submarinos, de 1902; e o «Bairro Residencial da Western Union Telegraph Co.», de 1925-28, que constitui o actual conjunto pavilhonar do Hotel Fayal, sobranceiro à baía. Na área destas «colónias», existe também a antiga casa do Cônsul Dabney, designada «The Cedars House».
Deve fazer-se uma referência à fábrica da baleia (de 1896, reconstruída em 1941), e à residência de veraneio dos Dabney (hoje em ruínas), ambas no lado sul da baía de Porto Pim.
Já do século XX ? e como consequência de um novo surto construtivo originado pelo violento sismo de 1926 ? mencionemos os prédios com fachadas muito decorativas (com remates de balaustradas ou platibandas, por vezes com «torrinhas» e frontões, apresentando nas fachadas vãos geminados), de gosto entre a Arte Nova e o Ecletismo, em tons rosa, verde e creme, erguidos na sequência do abalo:
- Edifício na Alameda Barão de Roches, cor rosa (esquina com o Jardim da Praça da República);
- Largo Duque de Ávila e Bolama;
- Rua Conselheiro Medeiros n.o 1 (com frisos cerâmicos Arte Nova);
- Fronteiro ao anterior, o n.o 4 da mesma rua;
- Rua Médico Avelar n.o 2 C;
- Casa do Comendador Eduardo Bulcão, na rua Conselheiro Medeiros n.o 18;
- Rua Vasco da Gama n.o 28 (também com frisos de azulejos Arte Nova);
- Rua Vasco da Gama n.o 66.
Igualmente de assinalar são as peças de equipamento da década de 1926-1936 (pós-sismo de 1926), com desenho de expressão mais ecléctica (Quartel de Bombeiros da *Associação Faialense de Voluntários; Esquadra da Polícia, no largo Duque de Ávila e Bolama), ou mais dentro do Art Deco (o Banco de Portugal, de luxuosa fachada totalmente em pedra; a Escola Primária Coronel Silva Leal; a Sociedade «*Amor da Pátria» de 1931-1934, por Norte Júnior; e a igrejinha da Conceição ? com ampliação para estrutura pastoral, em 2000, por Jorge Kol de Carvalho).
Da fase neo-tradicionalista da arquitectura portuguesa, em meados do século XX, o edifício mais representativo desta cidade é o dos Correios, constituindo a frente norte do largo do antigo Colégio, dentro do tipo «Português Suave» dos anos 1940-1950 (pelo arquitecto Adelino Nunes); mencionem-se igualmente a Capitania do Porto da Horta (com resquícios modernistas na composição volumétrica), e, mais recente, o Palácio de Justiça, erigido na avenida marginal. A adaptação do forte de Santa Cruz a pousada segue já a tendência moderna (embora com elementos tradicionais, como a tijoleira nos pavimentos e os persianados verdes nos vãos), inaugurada em 1969 e da autoria do arquitecto Alberto Cruz, da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (Fernandes, no prelo).
Mais recentemente, dos anos 1980-1990, há que mencionar o edifício da Caixa Geral de Depósitos (do arq. Nuno Teotónio Pereira), o da Assembleia Regional dos Açores (do arq. Manuel Correia Fernandes, resultado de concurso público, de 1982-1983, inaugurado em 1990), além de outras obras contemporâneas de expressão mais corrente ou sitas já nos arrabaldes. Na marina, refiram-se os edifícios de apoio: o Clube Naval da Horta, e novo edifício de Controle (Jorge Kol de Carvalho, 1986 e 2000) (Carvalho, no prelo).
Assinale-se ainda a presença de algumas pequenas habitações recentes, dentro do desenho da arquitectura moderna, como a da rua Marcelino Lima n.o 1 A (pelo arquitecto Paulo Gouveia, de 1997).
No campo da arquitectura religiosa, de tão forte efeito paisagístico no perfil da cidade, há que mencionar as três igrejas conventuais ou colegiais, de grande escala e espectacular fachada virada ao Pico:
- a Igreja de São Francisco, na rua Conselheiro Medeiros, datada de 1696, e com efeito de grande qualidade urbana sobre o largo que domina visualmente (com fachada de três arcos, a que se associa o quarto arco de acesso ao claustro, seguindo o modelo franciscano que vemos noutras ilhas);
- a Igreja e corpo do Colégio Jesuíta (de impressiva volumetria, central à povoação, constituindo a actual matriz e sede municipal; a igreja iniciou-se em 1680, o colégio em 1715; a matriz foi aqui instalada em 1825);
- e a Igreja do Carmo (setecentista, de dupla torre com remates bolbosos, tardiamente completada).
Refiram-se ainda, como elementos de arquitectura com interesse na cidade, a Igreja das Angústias (do século XIX, na rua Vasco da Gama), a Torre da antiga Matriz, largo D. Luís, do século XVIII (1700), e o Império dos Nobres, rua D. Pedro IV, de 1759.
No plano da arquitectura militar, devem referir-se os fortes e elementos fortificados que protegiam toda a linha costeira da povoação, com destaque para o Castelo ou *forte de Santa Cruz (rua Vasco da Gama), singela construção hoje adaptada a estalagem, para além dos várias fortificações da baía de Porto Pim (Guarita, Castelo de São Sebastião [ver forte de S. Sebastião], Portão de Porto Pim ou Reduto da Patrulha [ver forte do Porto Pim] e Bombardeira, com muro de articulação). José Manuel Fernandes
Bibl. Arquivo dos Açores (1983). [Ed. fac-similada da ed. de 1890]. Ponta Delgada, Universidade dos Açores, XI: 568-569. Barreira, C. G (1995), Um Olhar sobre a Cidade da Horta. Horta, Núcleo Cultural da Horta. Carvalho, J. K (2003), Arquitectura. Projectos e Obras nas Ilhas do Açores 1984-2003 (edição do autor). Fernandes, J. M. (1989), Angra do Heroísmo. Lisboa, Presença. Id. (1996), Cidades e Casas da Macaronésia. Porto, Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. Id. (2003), Horta ? uma leitura da sua evolução urbana. In Horta Faial ? Inventário do património Móvel dos Açores. S.l., Direcção Regional de Cultura, Câmara Municipal da Horta, Instituto Açoriano de Cultura [o texto acima, Horta ? urbanismo desenvolve-se a partir deste]. Id. (2004), Alberto Cruz, Arquitecto [in revista Monumentos n.o 20 da DGEMN, Março de 2004:161-165]. Freguesia da Matriz, Património Arquitectónico Histórico e Natural (s.d.). Folheto editado pela Junta de Freguesia da Matriz, Horta. Horta ? Faial ? Inventário do Património Móvel dos Açores (2003). S.l., Direcção Regional de Cultura, Câmara Municipal da Horta, Instituto Açoriano de Cultura. Lima, M. (1940), Anais do Município da Horta. Famalicão, Oficinas Minerva. Planta das Fortificações, e Bahias da Ilha do Fayal a qual por ordem da Real Junta da Fazenda destas ilhas dos Açores tirou o Sargento Mor do Real Corpo de Engenheiros José Rodrigo de Almeida, em 1804 (edição do IAC, s.d., cerca 2001) Instituto Açoriano de Cultura/Câmara Municipal da Horta e Museu Militar dos Açores [In arquivo do G.E.A.E.M./ Gabinete de Estudos Arqueológicos de Engenharia Militar, Lisboa, cota 278/3-44-4]