[N. Ponta Delgada, 20.12.1820 ? m. Ibid., 10.7.1898] Rico proprietário micaelense. Os seus restos mortais repousam na Igreja de Nossa Senhora das Vitórias - vulgo Ermida José do Canto - que fez edificar nas margens da Lagoa das Furnas em resultado de um voto feito por ocasião de grave enfermidade de sua mulher. Era filho do morgado José Caetano Dias do Canto Medeiros e de sua primeira mulher D. Margarida Isabel Botelho. Após as Letras Elementares, foi para o Colégio de Fontenay-aux-Roses (Paris), que, na década de 1830, era governado por um religioso português, fr. José da Sagrada Família. Porém, pouco se demorou em França desta vez. De regresso à ilha, decerto não descurou os estudos, pois aparece matriculado em Coimbra, na Faculdade de Matemática, onde também se não demora. Em 1842 casa com Maria Guilhermina Taveira Brum da Silveira de família faialense. Então vai dedicar-se à administração de suas propriedades agrícolas que possuía em S. Miguel, Pico, Faial e Terceira, em grande parte herança de sua mulher. Tendo vivido alguns anos em Paris (a acompanhar a educação de seus filhos), inspirado nos exemplos dos países que visitara, animado pelas condições climáticas e de fertilidade da ilha, muito se interessou pela criação de parques e jardins e, com esse fim, frequentou os melhores viveiros da Europa (Kew e Chiswik, de Londres; Chauvière e Chantin, de Paris). Neles se forneceu de variedades notáveis de espécies que foi introduzindo, com êxito, em S. Miguel. Cerca de 1859 já possuía viveiros suficientemente providos para encetar a plantação de áreas consideráveis. Chegou mesmo a abastecer com plantas dos seus viveiros o Jardim Botânico de Coimbra.
Entre as plantas introduzidas em S. Miguel, menciona-se o chá. Criou amizade com professores do Muséum de Histoire Naturelle de Paris: os irmãos Saint-Claire Deville, Broignard e Fouqué; o director Decaisne, do Jardin des Plantes, de quem foi amigo toda a vida. J. C. foi ainda generoso protector das Artes e das Letras. Assim aconteceu com o poeta Feliciano de *Castilho a quem chegou a montar uma oficina de tipógrafo com material comprado em Lisboa. A expensas suas, fez publicar em Paris (Dez.1866), em ed. de luxo, as ?Georgicas? de Virgílio traduzidas por Castilho. A Bulhão Pato e a Francisco Gomes de Amorim se estendeu o seu mecenato. Ao pintor Marciano Henriques da Silva, sabendo-o sem recursos, facultou-lhe os meios para cursar a Academia de Belas-Artes de Lisboa, encaminhando-o, depois, para Paris. Interessado como grande proprietário que era, esteve envolvido no grande empreendimento que foi a Doca de Ponta Delgada - sem se alhear, todavia, do estudo dos seus poetas, das exposições bibliográficas que promoveu, das obras raras que coleccionou e fazem parte da sua riquíssima livraria particular. «Bibliófilo muito instruído e versado na literatura pátria do Cinquecento» ?disse dele Carolina Michaelis de Vasconcelos. Na verdade, aproveitara muito da sua estadia em França onde travou muitas e úteis relações de toda a espécie, sendo, neste caso, de salientar o convívio que manteve com homens das Ciências e das Letras. ?No mundo das Letras, teve um íntimo em Ferdinand Denis, o sábio e erudito director da Biblioteca de Sta. Genoveva(..)? como informa seu sobrinho Eugénio Pacheco [E. Vaz P. do Canto e *Castro]. Conheceu ainda, pessoalmente, Lamartine, Léon Gautier, Edmont Abeut, outros ainda com quem estabeleceu relações. Já no fim da vida, iniciou a elaboração da sua ?Camoneana? (formosa colecção bibliográfica com mais de 360 páginas e cerca de 4.206 comentários), publicada em 1894, na qual teve, entre muitos outros, o auxílio dedicado do poeta Joaquim de Araújo, ao tempo cônsul de Portugal em Génova. Em Lisboa, mantinha ao serviço o conhecido livreiro (de Suas Majestades e Altezas), Manuel Gomes, estabelecido na Rua Garrett. Foi, com efeito, notável o alto grau de especialização atingido por José do Canto em matéria de bibliografia camoniana: o autor não se limita a fazer um simples catálogo ou inventário de livros, mas esse seu trabalho está recheado de inúmeros e eruditos comentários, de reparos críticos, de informações bibliográficas de grande interesse para quem se dedica aos estudos de Camões. A confirmação do valor da obra ? se não bastasse a opinião do Professor Teza (italiano) ? traduz-se nestas palavras de Teófilo Braga que agradece o exemplar oferecido, dizendo que, ?Da obra direi que a li de um trago, e que recebi novidades que se me tornam imprescindíveis para a refundição da minha História de Camões?. Pelo seu mérito nesta matéria, foi feito sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa. Fernando Aires (Out.2002)