Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Património Cultural Imaterial dos Açores Sinalização



Identificação da Manifestação

Designação: Festa da Lenha: Impérios do Espírito Santo - Sete Cidades, Ilha de São Miguel
Outras Designações:

Festa da Lenha; Dia da Lenha; Ir à Lenha; Espírito Santo

Domínio: Práticas sociais, rituais e eventos festivos
Categoria: Rituais Coletivos

Contexto Social

Comunidades, grupos ou indivíduos:

A Festa da Lenha – Impérios do Espírito Santo é celebrada na comunidade de Sete Cidades pelos seus habitantes.
Esta festa é assegurada pelo Mordomo do respetivo Império do Espírito Santo, com o auxílio dos seus sócios, familiares e amigos. Nela participam os homens e os rapazes, e as colaboradoras mulheres e raparigas da freguesia de Sete Cidades. São os homens e os rapazes que vão para o mato e são responsáveis por todo o trabalho de apanha, corte e armazenamento de toda a lenha recolhida neste dia de festa. Enquanto que as mulheres e as raparigas ficam em casa do respetivo Mordomo a preparar as refeições que serão disponibilizadas a todas as pessoas que participam nesta festa.
 


Contexto Territorial

Ilha(s): São Miguel
Município(s): Ponta Delgada
Freguesia(s): Sete Cidades
Espaço: Casa dos Mordomos e Caramanchão da respetiva Mordomia / Império do Espírito Santo

Contexto Temporal

Periodicidade:

A Festa da Lenha – Impérios do Espírito Santo (Sete Cidades, Ilha de São Miguel) realiza-se com uma periodicidade anual, sempre num sábado dos primeiros meses do ano, designadamente, nos meses que antecedem e procedem a Páscoa.


Caracterização da Manifestação

Caracterização e Historial:

A Festa da Lenha - Impérios do Espírito Santo (Sete Cidades, Ilha de São Miguel) é um evento festivo que ocorre em cada um dos três Impérios do Espírito Santo, respetivamente Império da Santíssima Trindade, Império de São João e Império de São Pedro. Este ritual festivo popular realiza-se exclusivamente* na comunidades de Sete Cidades.



*Não há registos, até agora, conhecidos dessa festa noutra localidade da ilha de São Miguel.



A preparação da Festa da Lenha



Nas Sete Cidades, desde o seu povoamento no século XVIII, celebram-se três Impérios do Espírito Santo, respetivamente o Império da Santíssima Trindade, o Império de São João e o Império de São Pedro. Os primeiros dois, são comummente reconhecidos como os Impérios dos adultos, enquanto, o último, por Império das crianças, tendo deste modo, dimensões e formas festivas distintas, embora a todos eles seja comum a Festa da Lenha.



Todos os Impérios celebram o dia da Festa da Lenha com muito trabalho,  muito entusiasmo, dedicação e alegria. Os Impérios são a festa por excelência. Por Impérios entende-se as conhecidas as Festas do Espírito Santo. Cada império tem uma duração semanal, onde se realizam um conjunto de cerimónias e festejos em casa do Mordomo, o indivíduo responsável pelo respetivo Império do Espírito Santo.



A preparação da Festa da Lenha é assegurada pelos Mordomos do Império do Espírito Santo, com a colaboração dos seus sócios, familiares e amigos mais próximos. Por sócios entendem-se as pessoas escolhidas pelos Mordomos para os ajudarem na organização do  Império do Espírito Santo. Estes colaboradores são a maior parte das vezes familiares ou amigos mais próximos. A Festa da Lenha realiza-se normalmente num sábado dos meses que antecedem e procedem a Páscoa, não se realizando durante a quaresma. É uma festa sem datas fixas que muda anualmente consoante a celebração da Páscoa, podendo ocorrer em fevereiro, março, abril ou maio, os meses que antecedem a realização dos Impérios do Espírito Santo.



Em Sete Cidades, tradicionalmente, o Mordomo de cada Império constrói o seu caramanchão – estrutura edificada em madeira e decorada com ramos e adornos em papel – onde são disponibilizadas as refeições comunitárias a todos os presentes, não só no dia da Festa da Lenha, como durante o período em que decorre o Império do Espírito Santo. Cada Mordomo com a ajuda dos seus familiares e amigos, algum tempo antes da Ida à Lenha, começa a construir o seu caramanchão, normalmente implantado e construído junto à moradia do Mordomo do respetivo Império.



Para ir à Lenha é necessário ter o caramanchão construído, pois vai ser ai o local de encontro da comunidade participante neste evento.



Para além do caramanchão, outra questão de substancial importância é a escolha do (a) cozinheiro (a) para confecionar as refeições servidas nas festividades do Espírito Santo, pois torna-se crucial ter uma pessoa capaz e responsável por tal tarefa. Depois da escolha convida-se o cozinheiro ou cozinheira.



Elaborado o caramanchão e delegado o (a) cozinheiro (a), os Mordomos, os seus sócios e o cozinheiro (a) procedem ao levamento e compra de todos os bens alimentares e outros necessários para a realização da Festa da Lenha. Uma ou duas semanas antes desta festa, os Mordomos do Império do Espírito Santo realizam um convite presencial, casa a casa  junto dos habitantes desta comunidade. Além disso, também convidam certas pessoas das localidades vizinhas, familiares ou amigos.



Aproximada então a data da Festa da Lenha, em casa dos Mordomos decora-se o caramanchão com rama e adornos em papel alusivos ao Espírito Santo e confecionam-se doces que serão degustados no tão esperado dia da Festa.  



A Festa da Lenha



Durante a Festa da Lenha, evento que envolve a participação ativa de quase toda a comunidade, recolhe-se toda a lenha a ser utilizada na realização do Império. É necessário apanhar, cortar e rachar muita quantidade de lenha para ser utilizada na preparação e confeção das várias refeições comunitárias que se vão realizar, bem como para o aquecimento da água utilizada na lavagem da loiça usada ao longo dos vários dias da mordomia.



Desde sempre, esta festa ocorre num sábado. Logo de manhã reúnem-se em casa do mordomo familiares e amigos, bem como grande parte da comunidade desta freguesia, para se começarem assim os preparativos para realizar a "ida à lenha", que decorre normalmente numa zona de mato localizada na bacia hidrográfica de Sete Cidades, local este que é previamente pensado pelo respetivo mordomo para proceder à apanha e corte da lenha. Neste dia, os homens e os rapazes (filhos, netos, sobrinhos, afilhados, etc.) vão para o mato apanhar, cortar, rachar e carregar a lenha, enquanto as mulheres e as raparigas (filhas, netas, sobrinhas, afilhadas, etc.) ficam em casa do mordomo a preparar o caramanchão e o almoço que é servido a todas as pessoas que participam nesta festa, verificando-se uma distinção de funções desempenhadas entre o género masculino e o género feminino. Para além disso, enquanto os homens trabalham nas tarefas da apanha, corte e carregamento da lenha, os filhos mais novos (rapazes), brincam e  oferecem comes e bebes aos “mais velhos” que se encontram a trabalhar. Pela hora de almoço, altura em que já terminaram a apanha da lenha, os homens passam pela casa do mordomo e percorrem toda a freguesia num cortejo, com as suas viaturas carregadas de lenha para mostrar a toda a comunidade  a lenha recolhida para a realização do Império do Espírito Santo. Findado este ritual, voltam à casa do mordomo onde descarregam toda a lenha angariada, sucedendo-se depois o almoço com todas as pessoas envolvidas neste dia de Festa da Lenha. Na maioria das vezes, são os homens e os rapazes que almoçam em primeiro lugar, sendo servidos pelas mulheres e raparigas, que só depois destes almoçarem é que almoçam. Depois de todos comerem, as mulheres e as raparigas lavam a loiça e arrumam o caramanchão, enquanto os homens e rapazes, procedem a arrematações de oferendas feitas ao Espírito Santo, visando a angariação de fundos monetários a utilizar no Império. Deste modo, importa salientar, que a Festa da Lenha inclui vários rituais de socialização, entre os quais se destacam o corte coletivo e a recolha da lenha, o cortejo, a refeição comunitária, as oferendas, as arrematações destas oferendas, o fogo-de-artifício,  entre outros. Muitas das vezes, as arrematações prolongam-se até à hora do jantar, procedendo-se após o seu término à disposição do jantar para toda a comunidade presente. A Festa da Lenha que ocorre de forma singular em cada um dos três Impérios do Espírito Santo, realiza-se antes das semanas dos Impérios. Quando acontece não se realizar um dos três Impérios, então a respetiva Festa da Lenha também não se realiza.



 



Historial:



A  Festa da Lenha, evento exclusivo da comunidade de  Sete Cidades,  integrada nas Festas do Espírito Santo, segundo a tradição oral,  e tendo por  base pesquisas e recolhas de campo efetuadas, é referido pelos  habitantes como remontando a tempos imemoriáveis. Dizem os mais velhos que sempre se lembram da realização destes festejos no âmbito dos três Impérios do Espírito Santo celebrados neste povoado rural: Império da Trindade, Império de S. João e Império de S. Pedro.



Consideramos  provável  esta festa estar ligada  a  uma  das antigas atividades dos habitantes desta  comunidade, o fabrico de carvão vegetal, resultante do aproveitamento da lenha dos matos. Esta atividade constituía, a par das lavadeiras, um importante recurso económico daquele povoado. Nestes trabalhos participavam homens e mulheres, sendo, no entanto, uma atividade maioritariamente masculina, tal como acontece na festa da lenha.  Para o fabrico do carvão, os carvoeiros cortavam a lenha nas encostas que circundavam as lagoas. Durante muitos anos, a atividade dos carvoeiros foi um importante recurso de subsistência destas gentes que iam vender o carvão a pé e de burro a Ponta Delgada, onde este era vendido para ser  utilizado no uso doméstico. A festa da lenha poderá ter raízes nesta atividade.

 


Manifestações associadas: Indissociavelmente ligada à Festa da Lenha – Impérios do Espírito Santo (Sete Cidades, Ilha de São Miguel) como indica, a própria denominação desta manifestação, encontram-se as Festas em louvor do Divino Espírito Santo, as festas caraterísticas dos povos açorianos. A Festa da Lenha é um evento festivo vivíssimo que acontece no âmbito das Festas do Espírito Santo festejadas na paróquia de Sete Cidades.

Transmissão da Manifestação

Estado: Ativo
Modos: Informal
Oral
Oral combinado com a escrita
Com recurso a objetos
Com recurso a edifícios

Identificação da Documentação de Suporte

Bibliografia:

ARRUDA, Jorge, 1912, Verde Azul – Sete Cidades: Lendas, Contos e Factos, Ponta Delgada

ATAÍDE, Luís Bernardo L. de, 1928-1929, Reminiscências da vida antiga em S. Miguel: subsídios para a etnografia e para a história da arte portuguesa, Ponta Delgada, 2 vols.

BRAGA, Teófilo,  1986, O povo português nos seus costumes, crenças e tradições. Lisboa: Dom Quixote

COSTA, Francisco Carreiro da, 1957, “As festas do Espírito Santo nos Açores: breve notícia a seu respeito, em cada uma das ilhas deste Arquipélago”, in Insulana: Órgão do Instituto Cultural de Ponta Delgada, Ponta Delgada: Instituto Cultural, Vol. 13 (Jan./Jun. 1957), p. 5-54

LEAL, João, 1994, As festas do Espírito Santo nos Açores: um estudo de antropologia social, Lisboa: Dom Quixote

MACIEL, Maria de Jesus, 2011, A casa do Espírito Santo, Ponta Delgada

MARTINS, Francisco Ernesto de Oliveira,1983, Em louvor do Divino Espírito Santo: fotomemória, Açores: Imprensa Nacional Casa da Moeda

MOTA, Valdemar – “As festas do Espírito Santos nos Açores antes e agora”. Atlântida. Ciências Sociais. Angra do Heroísmo: Instituto Açoriano de Cultura, 1990. Vol. 4, p. 135-146

OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, 1984, Festividades cíclicas em Portugal, Lisboa: Dom Quixote

PAVÃO, Rubens, 1989, Apontamento Histórico/Etnográfico de São Miguel e Santa Maria, Ponta Delgada: Direção Escolar de Ponta Delgada

RODRIGUES, Armando Cortes,  Os Açores, Lisboa: Bertrand

SILVA, Cristina & Costa, Eduardo, 2013, Sete Cidades: Uma das 7 Maravilhas Naturais de Portugal, Ponta Delgada: Câmara Municipal de Ponta Delgada

SILVA, Gabriela, 1997, “As festas do Divino Espírito Santo”, in Açorianíssima. Ponta Delgada: Publicações e Artes Gráficas, Lda. Vol. 64, p. 28-31

Registos fotográficos:

Total de 151 fotografias, registadas pela equipa PCI/MCM no dia 17 de maio de 2014, 12 das quais ilustram, abaixo, esta manifestação.

 

Registos fílmicos:

Registo videográfico da Festa da Lenha do Império de São Pedro no dia 17 de maio de 2014.

“Festa da Lenha – Império de São Pedro”, filme editado pela Equipa PCI do Museu Carlos Machado, patente na exposição “Para Além da Paisagem – Sete Cidades”, de 10 de julho a 6 de setembro de 2015.
Sinopse: A Festa da Lenha do Império de São Pedro realizada na freguesia de Sete Cidades no dia 17 de maio do ano de 2014, cujo mordomo foi o Miguel Medeiros Pavão.

 

Outra documentação:

Relatório da Saída de Campo - dia 17 de maio de 2014 (3 páginas).

Ficha biográfica e história de vida de Miguel Medeiros Pavão (1 página).

Anexos:
  • © Caramanchão do Império de São Pedro, preparado para o almoço do dia da Festa da Lenha, Sete Cidades, 2014

  • © Apanha da lenha do Império de São Pedro, Sete Cidades, 2014

  • © Homens a apanhar e a rachar lenha, Império de São Pedro, Sete Cidades, 2014

  • © Homens a rachar lenha, Império de São Pedro, Sete Cidades, 2014

  • © Da esquerda para a direita: O jovem Rui Pereira com o jovem Mordomo do Império de São Pedro, Miguel Medeiros Pavão, a distribuírem bebidas aos adultos que se encontram na apanha da Lenha, Sete Cidades, 2014

  • © Criança a servir petiscos aos adultos, no âmbito da Festa da Lenha, Sete Cidades, 2014

  • © Crianças a jogar ao jogo da navalha enquanto os mais velhos estão na apanha da lenha, Sete Cidades, 2014

  • © Zona de mato onde se realiza a Festa da Lenha - Império de São Pedro, Sete Cidades, 2014

  • © Carregamento da lenha angariada, Sete Cidades, 2014

  • © No dia da Festa da Lenha, depois da apanha, limpa-se a zona de mato utilizada, Sete Cidades, 2014

  • © Fim da apanha da lenha, vendo-se as viaturas carregadas com a lenha angariada para o Império de São Pedro 2014, Sete Cidades, 2014

  • © Fim da apanha da lenha, vendo-se os tratores carregados com a lenha angariada para o Império de São Pedro 2014, Sete Cidades, 2014


Património Associado


Registo criado por: Museu Carlos Machado
Data do registo: 23-03-2016

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