Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Património Cultural Imaterial dos Açores Sinalização



Identificação da Manifestação

Designação: Produção Artesanal em Espadana - Arrifes, Ilha de São Miguel
Outras Designações:

Espadana; linho-da-Nova-Zelândia; tabua; amarradeira; atadeira; arremadeira.

 

Domínio: Competências no âmbito de processos e técnicas tradicionais
Categoria: Manifestações artísticas e correlacionadas

Contexto Social

Comunidades, grupos ou indivíduos:

Nos Açores usa-se as folhas da espadana como amarradeira e também como matéria-prima na produção de diversos artefactos.

Na ilha de São Miguel há várias pessoas, principalmente da geração mais idosa, que sabem e fabricam artefactos em espadana.

A Equipa do Património Cultural Imaterial (PCI) do Museu Carlos Machado sinalizou o artesão Bento Silva como exemplo de prática desta manifestação. Bento Silva dedica-se à produção artesanal de vários trabalhos em espadana, nomeadamente capachos, flores, chapéus, cordas, entre outros artefactos.


Contexto Territorial

Ilha(s): Ilha de São Miguel
Município(s): Ponta Delgada
Freguesia(s): Arrifes
Espaço: Doméstico (casa do artesão)

Contexto Temporal

Periodicidade:

A presente manifestação, produção artesanal em espadana, realiza-se ao longo do ano, não existindo propriamente uma data ou uma época festiva específica para a sua realização.

Os trabalhos efetuados em espadana são elaborados consoante o tempo livre do artesão, e também de acordo com as encomendas que lhe são endereçadas.


Caracterização da Manifestação

Caracterização e Historial:

Caraterização:



A espadana ou linho-da-Nova-Zelândia é o nome atribuído à espécie botânica denominada Phormium Tenax, pertencente à família Lillaceae.



Carateriza-se por ser uma planta herbácea de fibras muito resistentes, apresenta uma raiz carnosa, tuberosa e as suas folhas são longas de cor verde intenso, podendo chegar a atingir entre 1,5 metros a 2 metros de cumprimento, sendo na forma, muito semelhantes à lâmina de uma espada.



Este tipo de espécie vegetal desenvolve-se e floresce bem em terrenos próximos do mar e com grau elevado de humidade. Em conformidade com esta afirmação, também o primeiro jornal agrícola português editado em São Miguel - “O Agricultor Michaelense” – no seu número de abril de 1848, ao chamar a atenção para a cultura desta planta útil, relata o seguinte: “O Phormium Tenax dá-se em quase todas as partes, porém folga mais com vales e sítios um tanto húmidos.”.



É uma planta que tem folhas durante todo o ano. Conhecida na ilha de São Miguel pelos nomes comuns de “tabua”, “amarradeira”, “atadeira”, “arremadeira”.  Na ilha de São Jorge, designam-na de “carriola”, na Terceira, “filaça” e na Graciosa “piteira”.



Esta planta têxtil, serve de matéria-prima ao fabrico de panos, cordas, chapéus, capachos, flores e tantos outros artefactos.



Bento Silva, natural dos Arrifes, Ponta Delgada, aprendeu com o pai vários ofícios ligados à terra, nomeadamente o trabalho dos vimes. Entretanto, há cerca de sete anos, começou também a produzir objetos em espadana. Referiu-nos que iniciou a realização dos trabalhos em espadana por si próprio. Imagina as peças e cria-as.



Quando tem oportunidade é na sua moradia que produz “e dá vida” aos seus objetos, tal como nos frisou “sempre em horas que, por exemplo, se o tempo não der para trabalhar na agricultura, nesses momentos eu dedico-me a esses trabalhos, aos fins-de-semana e ao serão também”.



A produção de peças artesanais em espadana pressupõe um processo dividido em várias fases. Bento Silva refere que, em primeiro lugar, a espadana a utilizar para a produção de qualquer artefacto tem que estar verde, pois se estiver seca ao trabalhá-la irá quebrar-se rapidamente. Para iniciar a elaboração de uma peça, numa primeira fase, devem-se rachar as folhas da espadana, isto é, tem de se as abrir para libertarem a seiva, em seguida deixam-se secar. Depois de rachadas, e com a seiva já seca, faz-se a trança. Realizada a trança começa-se a criar o capacho ou qualquer outro artefacto, construindo a sua forma e cosendo-a com uma agulha forte e com fio de espadana. Como se trata de uma matéria-prima de origem vegetal, após os produtos artesanais estarem concluídos, interessa assegurar a sua preservação e conservação. Neste sentido, quando as peças estão terminadas, o artesão pincela-as com verniz para uma melhor proteção e durabilidade.



 



Historial:



Originária da Nova Zelândia, da ilha de Norfolk, a espadana foi introduzida em Portugal em 1798 pelo abade José Correia da Serra (1750-1823), um dos fundadores da Academia das Ciências de Lisboa. Quanto à sua introdução nos Açores, a primeira ilha em que foi introduzida foi em São Miguel, no século XIX, graças à ação de Francisco Soeiro Lopes de Amorim, no ano de 1828.



Rapidamente difundida pelos vários terrenos da ilha, a espadana começou a ser alvo de atenção por parte do povo micaelense. Num espaço de tempo de 20 anos, isto é, em 1848 a Sociedade Promotora de Agricultura Micaelense (SPAM) começou a dedicar uma atenção especial a esta cultura. Contudo, apenas em 1880 é que esta espécie começou a revelar interesse industrial para os micaelenses, ano em que chegou à ilha uma máquina desfibradora de espadana, por iniciativa de José Bensaúde (1835-1922) e de José Jácome Correia (1816-1886). Esta máquina foi instalada em Ponta Delgada para trabalhar as plantas que José Bensaúde tinha cultivado em terrenos seus na Serra de Água de Pau. Nestas circunstâncias, também Guilherme Read Cabral (1821-1897) tentou obter capitais para investir no aproveitamento industrial destas fibras vegetais. Em 1898 esta indústria sofreu um enorme incremento. No início do século XX, exatamente em 1930, existiam sete fábricas de desfibração de espadana em São Miguel. Atualmente esta indústria já não existe na ilha, contudo a planta continua a ser cultivada, pois além de ornamental, é utilizada no fabrico de objetos artesanais e ornamentais, como o caso aqui exposto, a espadana é também usada para fazer os “cinchos” utilizados na produção de queijos frescos. Esta planta útil é também utilizada para atar os manchos das “novidades da terra”, bem como para amarrar vinha, entre outros usos.



Para finalizar, importa ressalvar que, segundo vários artigos, datados desde finais do século XIX até meados do século XX, a indústria da espadana representou em São Miguel um capítulo económico da maior importância. No entanto, com o surgimento da fabricação de tecidos e de outros utensílios obtidos através de fibras sintéticas, esta indústria acabou por desaparecer.



Cinchos: são formas circulares feitas tradicionalmente em folha de espadana, para enformar os queijos frescos.



 



 



Transmissão da Manifestação

Estado: Ativo
Modos: Oral
Com recurso a objetos

Identificação da Documentação de Suporte

Bibliografia:

ALMEIDA, Verónica (Coord.), 2014, A Produção de Espadana na Lagoa – Quinta do Vulcão, Lagoa: Câmara Municipal de Lagoa

CABRAL, Guilherme Read, 1891-1892, “Phormium Tenax”, in Portugal Agrícola, Lisboa: Tipografia da Companhia Nacional Editora, nº 3, pp. 383-387

CASTRO, José Caetano Vaz Pacheco do Canto e, 1930, “A Indústria de Desfibração da Espadana (Phormium Tenax) na ilha de São Miguel”, in Boletim do Trabalho Industrial, Lisboa: Publicações da Repartição do Trabalho Industrial, nº 146

COSTA, Carreiro da, 1950, “A Espadana em São Miguel”, in Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, Ponta Delgada: Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, (2º sem.) nº 12, pp. 117-118

COSTA, Carreiro da, 1956, “A Espadana (Phormium Tenax, Forst) na ilha de São Miguel”, in Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, Ponta Delgada: Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, (1º sem.) nº 23, pp. 141-145

COSTA, Carreiro da, 1978, Esboço Histórico dos Açores, Ponta Delgada: Instituto Universitário dos Açores, pp. 217-218

DIAS, José Maria Teixeira, 2011, A História do Povo Açoriano, Ponta Delgada: Publiçor

GAGO, José, 1928, “A Cultura da Espadana: o seu futuro na ilha de São Miguel”, in Os Açores, Ponta Delgada: Of. De Artes Gráficas, nº 3, p. 23

 

Outros documentos escritos:

Bento Silva tem 64 anos, nasceu em 1953, nos Arrifes, concelho de Ponta Delgada. Detentor de vários saberes, possui a 4ª classe, é agricultor, lavrador, produtor de utensílios em espadana e em vimes, dominando também as técnicas de construção de muros de pedra seca.

Quanto à agricultura, à lavoura, aos vimes e aos muros de pedra seca, Bento pratica estas várias atividades desde a sua infância e juventude e foi com o pai que apendeu estas diferentes artes e ofícios. Além do vasto património de saberes acumulado e das diversas ocupações que tem no seu dia-a-dia, é formador de cursos de artesanato, nomeadamente, de trabalhos em vime e espadana. Já ministrou pelo menos 4 cursos nos Arrifes, por conta da respetiva Junta de Freguesia local.

Com a realização destes cursos e após o incentivo dos (as) formandos (as), Bento Silva inscreveu-se no Centro Regional de Apoio ao Artesanato (CRAA), sendo artesão certificado em capacharia e cestaria, desde há pelo menos dois anos.

É também formador em workshops nas especialidades acima referidas.

Até à data já realizou dois workshops com o Museu Carlos Machado. O primeiro decorreu no próprio edifício do Museu nos dias 16 e 23 de abril de 2016. O segundo decorreu na loja Eco-Atlântida nas Sete Cidades no dia 11 de junho de 2017 e surgiu no âmbito do projeto Para Além da Paisagem, resultado de uma parceria entre o Museu, o Centro Regional de Apoio ao Artesanato e a Cresaçor. Já deu várias formações nas Furnas. Importante é de igual modo ressalvar, a sua participação como artesão na PRENDA - Festival de Artesanato dos Açores.

A partir destas várias experiências de interação com o público, Bento Silva observa que há sempre pessoas com vontade de aprender, mas conclui que são maioritariamente pessoas mais velhas e mulheres que manifestam um maior interesse e procura por estes trabalhos e respetivas oficinas. Todavia, o artesão lamenta a falta de entusiasmo por parte das gerações mais novas em aprender esta tipologia de artesanato. Inclusivamente, disse-nos que, “É bom que a gente dê continuação a isto. Eu tenho sempre aquele gosto que houvesse pessoas com idades mais novas que também se dedicassem a isto… Oxalá que aparecessem mais pessoas novas, para darem continuidade e passarem o saber para outros”.

Registos fotográficos:

Total de 123 fotografias, registadas pela equipa PCI/MCM nos dias 17 de outubro de 2014 (1 fotografia), 5 de março de 2017 (1 fotografia), 25 de maio de 2017 (9 fotografias), 11 de junho de 2017 (50 fotografias), 22 de novembro de 2017 (60 fotografias) e 6 de janeiro de 2018 (2 fotografias), 15 das quais ilustram, abaixo, esta manifestação.

Anexos:
  • © Plantação de espadana de Maria da Glória Medeiros e José Medeiros Roque, Sete Cidades, 2014

  • © Mancho de coentros atado com espadana, 2018

  • © Mancho de rúcula atado com espadana, 2018

  • © Amarrar vinha com espadana, Rocha da Relva - Relva, 2017

  • © Bento Silva a rachar as folhas de espadana, Arrifes, 2017

  • © Bento Silva a elaborar a trança com as folhas de espadana após terem sido rachadas, Arrifes, 2017

  • © Trança de espadana já elaborada por Bento Silva, Arrifes, 2017

  • © Formandas a elaborarem a trança de espadana durante o workshop de capachos de espadana realizado por Bento Silva na Eco-Atlântida, Sete Cidades, 2017

  • © No workshop realizado por Bento Silva na Eco-Atlântida, formanda a produzir um protetor de calor em fibras vegetais de espadana, Sete Cidades, 2017

  • © Protetor de calor em espadana produzido pelo artesão Bento Silva, Arrifes, 2017

  • © Durante o workshop de espadana Bento Silva a ensinar a elaboração das flores de espadana, Sete Cidades, 2017

  • © Flores de espadana produzidas pelo artesão Bento Silva durante o workshop nas Sete Cidades, 2017

  • © Capacho de espadana produzido pelo artesão Bento Silva, Arrifes, 2017

  • © Chapéu em espadana produzido pelo artesão Bento Silva, Arrifes, 2017

  • © O artesão Bento Silva junto aos seus diversos trabalhos em espadana e em vime, Arrifes, 2017


Património Associado


Registo criado por: Museu Carlos Machado
Data do registo: 09-01-2018

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